14 de outubro de 2010

A mudança que queremos ver no Mundo

Este post foi publicado no blog Raízes - Arte e Prosa e de autoria de Marianne Costa, achei super interessante e resolvi postá-lo aqui também. Vale a leitura!!!


Confira o artigo da coluna Pensar Global, Agir Local, da sócia da Raízes Marianne Costa, veiculada na Revista Aventura e Ação N0 58.

É possível aproveitar o poder do mercado livre para resolver os problemas da pobreza, da fome e da desigualdade no planeta? Para muitos, isso não passa de utopia, mas Muhammad Yunus (o “banqueiro dos pobres”) usa a teoria e a prática para provar o contrário.

Em maio, aconteceu no Rio de Janeiro o III Fórum Internacional de Comunicação e Sustentabilidade, que contou com Muhammad Yunus como palestrante. Se você não o conhece, com certeza já ouviu falar de algum dos seus projetos, da expressão “banqueiro dos pobres” ou do microcrédito, criado e difundido por ele. Resolvi compartilhar um pouco da proposta do Fórum e das ideias do Sr. Yunus, pois elas têm muito a ver com o objetivo dessa coluna: mostrar que muito do que vem sendo pensado globalmente por aí pode ser aplicado no nosso dia a dia.

Entre as temáticas que motivaram a realização do encontro está a influência que a grande mídia tem no que somos e consumimos. Divulga-se que o Brasil só perde para o México como o país mais influenciado pela mídia contemporânea. Isso só prova o quanto a comunicação pode ser inimiga ou aliada na “mudança que queremos ver no mundo”, parafraseando Mahatma Gandhi.

Nunca se falou tanto em aquecimento global, poluição, destinação de resíduos, desequilíbrio ambiental, mudanças limáticas e, claro, sustentabilidade. Mas a distância que existe entre o discurso, todo esse barulho, e a prática é fácil de explicar: somos o que consumimos. Por isso é tão importante sabermos responder algumas questões que dizem sobre nossa própria identidade e o impacto que geramos no mundo. Como consumimos? De quais empresas compramos? O que consumimos? Estamos conseguindo transpor o “mundo das ideias” e praticar tudo que ouvimos e falamos? Não precisa ser nenhum especialista para responder, eu mesma faço isso: Não, não estamos.

Por isso, a educação e a comunicação têm uma influência fundamental nas nossas mudanças de hábito de consumo, que começam por você, por mim, por nossos vizinhos, amigos, família, colegas de trabalho.

Muhammad Yunus conseguiu fazer essa transposição da teoria, literalmente, pois era professor doutor de Economia em uma universidade em seu país, Bangladesh, quando se incomodou com a incoerência em ensinar aos alunos os modelos econômicos tradicionais, enquanto milhares de pessoas no entorno da Universidade não se incluíam em nenhum daqueles modelos e viviam abaixo da linha da pobreza. Desde então, seu objetivo de vida passou a ser “colocar a pobreza nos museus”, pois no mundo em que vivemos não há mais espaço para ela. Desde seu primeiro incômodo” já se passaram mais de 30 anos e, em 2006, Muhammad Yunus e o Banco Grameen, o primeiro dos seus empreendimentos sociais, ganharam o Prêmio Nobel da Paz como reconhecimento pela coragem, excelência e expressivos resultados alcançados.

O PONTAPÉ INICIAL: O BANCO GRAMMEN
A primeira iniciativa de Yunus foi a fundação do Banco Grameen, cujo negócio é emprestar dinheiro para pessoas carentes que, através dos meios convencionais, nunca teriam acesso a nenhum tipo de crédito. Estava criado o “microcrédito”. O Banco Grameen tem hoje mais de 7,5 milhões de usuários, dos quais 65%, ou seja, 4,87 milhões de pessoas conseguiram vencer a pobreza extrema.

Visto dessa maneira, temos a impressão de que se trata de um trabalho de grandes dimensões, com importantes apoiadores. Hoje até pode ser assim, mas sabe como Yunus começou seu trabalho? Observando a aldeia vizinha à Universidade onde trabalhava. Lá, ele percebeu que diversas famílias não conseguiam evoluir economicamente, pois encontravam-se dependentes de agiotas, única alternativa de crédito a que tinham acesso. Como deve se imaginar, eram cobradas taxas de juros tão elevadas que, concluiu o professor, elas trabalhavam para pagar juros e, às vezes, para sobreviver. Estas pessoas estavam escravizadas em um círculo vicioso da pobreza.

Com a ajuda de dois alunos, Yunus levantou informações de todos os que tomavam empréstimos na região (um grupo de 42 pessoas) e descobriu que a soma dos valores emprestados não ultrapassava 27 dólares. Assim, ele mesmo se disponibilizou a emprestar o dinheiro a estas pessoas, com juros bem mais baixos e observou a grande diferença que fez. Assim, nasceu o Banco Grameen, que, 30 anos depois, já teve sua experiência replicada em mais de 40 países.

A EMPRESA SOCIAL
Mas Yunus não parou aí. Com sua experiência no Banco, o professor deu início a uma série de outras empresas cujo foco é combater a pobreza. Tratam-se de negócios em diferentes setores como alimentação, agricultura, telefonia móvel, internet, geração de energia, saúde, educação e indústria têxtil. Em todas elas, as pessoas são, além de usuárias, protagonistas do processo de criação e implementação. E você entendeu certo, ele criou empresas. São as chamadas empresas sociais, definidas por ele como empresas que têm como objetivos igualmente importantes: a geração de lucro e a resolução,de problemas sociais e ambientais.

Estas organizações são movidas por uma causa social e não apenas pelo lucro. Geram receita de vendas de produtos ou serviços, enquanto beneficiam pessoas mais necessitadas e a sociedade como um todo.

Apesar disso, não se tratam de instituições de caridade, pois precisam recuperar suas despesas e alcançar seus objetivos sociais. Os investidores, porém, geralmente recuperam apenaso valor investido e não lucros sobre esse valor. O excesso é reinvestido na própria empresa, para maximizar o benefício social.

Segundo Yunus, o modelo de empresa social surge em resposta à satisfaçãocom a forma como o capitalismo, enquanto modelo econômico, vem prosperando financeiramente, ampliando a desigualdade social e agravando o problema da distribuição de renda no mundo.

Esse tipo de proposta nos instiga a repensarmos a forma como empreendemos e trabalhamos, e também como, de quem e com quem gastamos nossos recursos. É uma boa reflexão para avaliarmos os critérios de seleção que usamos para escolher as empresas que nos servem, se elas estabelecem e cumprem seus objetivos sociais, se é que eles existem.

O EVENTO

Durante sua participação no Fórum, Yunus reforçou a importância de estimularmos as empresas sociais e principalmente, a ideia de que qualquer um de nós pode criar uma. Segundo ele, “estamos sempre apontando o dedo e cobrando do governo ou da iniciativa privada, mas precisamos fazer nós mesmos. Não precisamos resolver o problema do País inteiro, mas podemos começar pequeno, plantando uma pequena semente e estimulando as pessoas a replicá-las”. Todos nós temos nossa responsabilidade em fazer um “mundo melhor” e para Sr. Yunus criar empresas sociais é um caminho muito eficiente e “divertido”.

Sobre a sustentabilidade das entidades sem fins lucrativos, o Sr. Yunus destacou que o dinheiro gasto em captação de recursos externos para sua sobrevivência poderia ser investido na criação de empresas sociais, tornando as entidades menos dependentes dos recursos externos e estimulando a criatividade e comprometimento dos próprios beneficiários, rompendo com o ciclo do assistencialismo.

Uma das principais questões levantadas pelos jornalistas ao Sr. Yunus, desde que chegou ao Brasil, foi sua opinião sobre o programa do governo federal, o Bolsa Família. Muito sábio, o professor não fez críticas, como todos esperavam. Manteve sua postura otimista e destacou: “o governo fez sua parte ajudando os que precisam. Agora é a nossa vez de fazer a nossa e ajudar todas estas famílias a precisarem cada vez menos destes programas, através das empresas sociais.”

Para mostrar que já é possível empreender socialmente no Brasil, trouxe aqui alguns exemplos de empresas que considero que estão próximas desse conceito de empresa social e uma boa fonte de referência no Brasil: a organização não governamental Artemísia, que apoia negócios sociais no Brasil e seus parceiros.

ARTEMÍSIA: www.artemisia.org.br
Organização pioneira em negócios sociais no Brasil que busca atrair e formar pessoas qualificadas para atuar na criação e desenvolvimento de um novo modelo de negócio, que possa contribuir para reduzir as desigualdades socioeconômicas no mundo.

THE HUB: www.the-hub.com.br
O Hub São Paulo é uma espécie de “incubadora” de empreendimentos sociais que oferece espaço físico, infraestrutura e serviços para que empreendedorescom ideias inovadoras possam acessar recursos, realizar conexões, produzir e compartilhar conhecimento.

ECOTECE: www.ecotece.org.br
Trabalha com produção e comercialização de artigos de moda, produzidos com matérias-primas sustentáveis e com o trabalho de cooperativas, praticando os conceitosdo comércio justo.

AOKA Operadora de Turismo Sustentável: www.aoka.com.br
Uma empresa que busca elevar o turismo a um novo patamar de sustentabilidade e interatividade com os destinos visitados, atuandojunto a comunidades tradicionais eONGs locais. Através de sua atividade, busca promover inclusão social, geração de renda e incentivo ao empreendedorismo relacionado ao turismo responsável, que valorizaa cultura local e a troca de conhecimentos entre comunidades e visitantes.

SEMENTES DE PAZ: www.sementesdapaz.org
É uma cooperativa de logística e distribuição de alimentos e produtos ecológicos e solidários que integra uma rede de consumo e cooperaçãoeconômica situada na RegiãoMetropolitana de São Paulo. O trabalho é pautado pelos princípios da Agroecologia, da Economia Solidária,do Comércio Justo e do Consumo Responsável.

AMAPÁ BRASIL: www.amapabrasil.com.br
Agência de comunicação com foco em sustentabilidade, a Amapá tem preocupação com a geração de lucro, em ser social e ambientalmente sustentável, unindo características do segundo setor, como planejamento e objetividade, e do erceiro setor, como idealismo e foco nas pessoas.

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